quarta-feira, 11 de outubro de 2017

domingo, 15 de setembro de 2013

Domingo barulhento

Dia de domingo deveria ser um dia de descanso e lazer, mas parece que o "lazer" é só para os vizinhos, que resolvem fazer festa sem hora certa para acabar. A perturbação do sossego é absurda. Não temos como estudar ou dormir um pouco, pois o barulho infernal causa desconforto. Até quando vamos ter que conviver com pessoas que só reconhecem um único direito: o próprio. Fica o desabafo neste domingo entediante.

sábado, 12 de janeiro de 2013

 
Excelente livro de Filosofia, todo ilustrado e com uma linguagem de fácil compreensão. Sugestão de leitura da semana.

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Tragédia Anuciada

No Rio de Janeiro, três coisas são certas a cada ano: queima de fogos em Copacabana, mortes por deslizamento e o Carnaval. Este ano não poderia ser diferente. Áreas totalmente insalubres e inadequadas para moradia são ocupadas em proporções catastróficas. O povo necessita morar em qualquer lugar e a qualquer custo, o governo deixa como está para ver como é que fica. A tragédia do Rio parece anunciada. Lembro-me do noticiário da TV em que o apresentador dizia que, no Brasil, já deveriam existir alarmes para previsão de tragédias desse tipo, como existem em países onde as ameaças são os terremotos, por exemplo. Eu acho que além dos alarmes, deveriam haver vergonha na cara das autoridades, políticas sérias de remanejamento dessas populações para áreas mais adequadas, construção de conjuntos habitacionais para comportá-las, enfim, tirá-las da beira do abismo. É triste mais uma vez assistir a esse espetáculo trágico, no qual a desgraça alheia salta aos olhos e a dor é como se fosse em nós. Acredito que a sensibilidade inerente ao homem é que faz com que sintamos profundamente por aquelas pessoas. Cada lugar tem suas mazelas. Nossa cidade também tem as suas. Convivemos com áreas permanentemente alagadas, a baixadas, bolsões de miséria, violência desmedida, assaltos com reféns a cada dia. Sobrevivemos, assim como o povo do Rio de Janeiro, sob a égide de governantes corruptos, parlamentares canalhas, governadores e prefeitos demagogos, entre outros. Nossas tragédias são parecidas, mas as daquele povo doem demais na alma por poderem ter sido evitadas com ações simples. Mais de duzentas pessoas perderam a vida mais uma vez. Mais pessoas morrerão lá e aqui, até que se olhe para essas calamidades com mais sensibilidade, com sentimento de humanidade e de amor ao próximo. O Brasil está de luto pelo povo do Rio de Janeiro.

Aniversário de Belém

Belém fez ontem 395 anos e as festas se proliferaram pela cidade. Aniversários são sempre a mesma coisa: um monte de gente só lembra da gente nesse dia, nos outros, deixam-nos ao abandono. Com Belém não poderia deixar de ser assim. Os governantes se debulharam em homenagens, shows foram promovidos, bolos gigantescos foram cortados. O atual prefeito, a rigor, comportou-se como um filho desnaturado. Limitou-se a inaugurar umas obras maquiadas. Coisas da política. Uma coisa me chamou a atenção nesse aniversário de Belém: a hipocrisia daqueles que deveriam zelar para que essa senhora de 395 anos conservasse a beleza que sempre ostentou. Costuma-se mostrar os casarões do centro, os prédios da Belle Époque, os imponentes edifícios da Doca e Batista Campos, mas esquece-se de mostrar a realidade do povo que também faz parte desta cidade. As pessoas da periferia são esquecidas nessa festa. Não têm o que dar nem o que receber. São coadjuvantes da história que se faz a cada dia. Nunca são convidados a escrever o cotidiano de uma cidade que tem tudo para ser linda. Para os olhos de quem mora em outros lugares, Belém é a opulência do Ver-o-peso, a modernidade do Hangar e das Estação das Docas. Para eles, não existem Tapanã, Benguí, Terra Firme, Jurunas e Marambaia. Essas pessoas que ali habitam são mantidas na "cozinha" do salão de festas. Uma festa pobre, assim como é pobre o espírito daqueles que se acham no direito de excluir os filhos de Belém da vida desta cidade. Enfim, não temos o que comemorar. É só mais uma passagem de ano que se arrasta a passos lentos, trazendo até nós a melancolia do esquecimento.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

A África é Logo Aqui...

Pedintes, camelôs e pobreza: nada disso é o que mais impressiona no Soweto, bairro mais populoso de Johannesburgo - reconhecido no mundo como pobre e celeiro da resistência contra a racista política do Apartheid na África do Sul.
Igrejas de várias fés com seus pastores pregando sobre chão batido, churrascos (ou algo que valha), crianças brincando na rua: também nada disso choca - pelo menos a nós, brasileiros, infelizmente acostumados com cenas muito parecidas.
A visita ao Soweto não nos choca.
Primeiro é necessário dizer que Soweto não se trata de "favelão". Há sim zonas com barracos e casas de madeira - mas é a ínfima minoria. As casas de alvenaria são maioria. Maioria como são as garagens recheadas de carros. Maioria como são as antenas de TV por satélite espalhadas sobre os tetos das casas de alvenaria.
Barracos de zinco e madeira ao lado do Orlando Stadium em Soweto: minoria
A visita ao Soweto deixa claro, entretanto, algo que ainda é muito presente na África do Sul: a separação entre brancos e negros.
Um dia inteiro no Soweto, e os únicos brancos que eu vi foram os "turistas" ou "visitantes ocasionais", já que ontem houve uma partida de rúgbi (esporte "de branco") no Orlando Stadium.
Um dia inteiro no Soweto, e vi apenas um mulato. Um único.
Um dia inteiro no Soweto, e uma visita ao Memorial Hector Pietersen me fez mais uma vez ter medo do que o ser humano é capaz.
Entre fotos e informações históricas sobre as manifestações contra a política do apartheid, especialmente contra a regra imposta pelo governo branco de ensinar africâner (língua da minoria branca) às crianças negras em meados da década de 1970, uma declaração de um ministro ("arquiteto do apartheid") exposta letra por letra em uma das paredes me deixou pasma:
"As crianças negras precisam saber que a igualdade de direitos, como entendida pelos europeus, não é para elas." (Hendrik Frensch Verwoerd) 
Foi em 1963. Ontem...
Aterrorizante.

sexta-feira, 21 de maio de 2010

Eventos Acadêmicos - UFPA


Eventos

segunda-feira, 3 de maio de 2010

O Mapa da Violência no Pará


Pará é campeão de homicídios na Região Norte



Em dez anos, número de assassinatos subiu 195,4% no estado. Os dados são do Mapa da Violência 2010
O Brasil registrou, em 2007, um total de 47.707 homicídios, número equivalente ao de toda a população de uma cidade paraense de porte médio. Desse total, 3.994 pessoas foram assassinadas no Norte do Brasil, cabendo ao Pará, com 2.204 (55,1%), mais da metade de todos os homicídios da região. Considerando que, em 1997, o número de assassinatos no Pará havia sido de 746, conclui-se que em apenas uma década houve um crescimento de espantosos 195,4%, o que praticamente triplicou o número de homicídios ocorridos anualmente no estado.

Esses dados constam no Mapa da Violência 2010, divulgado pelo Instituto Sangari Brasil, instituição que atua na área da educação em 15 países. Presente no Brasil há doze anos, o Sangari vem realizando também aqui estudos sobre as causas da violência, entre outros fatores que podem afetar negativamente o desempenho de educadores e estudantes em sala de aula. “Uma educação de qualidade depende, antes de tudo, de ambiente pacífico, que ofereça condições físicas e psicológicas favoráveis ao ensino e à aprendizagem”, afirma Ben Sangari, presidente do instituto, acrescentando que espaços marcados pela violência em suas várias formas prejudicam enormemente a educação.

Um dado supreendente da pesquisa, revelado pelos números do Sangari Brasil, é o fato de que pela primeira vez desde 1979 houve um período de declínio nos índices de homicídio do país. Esse recuo se deveu a uma queda considerável no número de assassinatos no Estado de São Paulo. De 12.552 homicídios em 1997, em números absolutos, caiu para 6.234 em 2007, última atualização disponível, o que corresponde a uma retração de 50,3%.

O decréscimo provocado pelos números favoráveis de São Paulo, porém, só aparece nos índices nacionais quando se calculam as taxas de homicídio por grupo de 100 mil habitantes, já que, no total, houve crescimento em números absolutos em função da elevação dos índices do Pará e de outros estados. Além do Pará, com o já mencionado incremento de 195,4% nas taxas de homicídio, entram de maneira negativa nas estatísticas da violência os Estados do Maranhão, com crescimento de 241,3%, Minas Gerais (213,9%), Sergipe (176,8%), Piauí (165,4%), Rio Grande do Norte (150,6%) e Goiás, com 105,2%.

Quando é considerada a taxa de homicídio por 100 mil habitantes, os números acabam se relativizando em virtude de variações dos contingentes populacionais dos estados que são objeto do estudo, seja pelo seu crescimento vegetativo, seja pela diferente intensidade dos fluxos migratórios. A taxa de homicídios do Estado de São Paulo, que numa década caiu 50,3% em números absolutos, sofreu uma redução ainda maior na proporção por 100 mil habitantes, ficando em -58,6%.

No caso do Pará, o crescimento da taxa por 100 mil (130,3%) foi menor que a de números absolutos, mas situou-se ainda assim num patamar muito acima do tolerável, sobretudo quando se considera que a taxa nacional registrou na última década uma variação negativa de -7%, puxada que foi para baixo pelo recuo observado no Estado de São Paulo. A taxa paraense, que era de 13,2% em 1997, chegou a 2007 na casa de 30,4%.

Fonte: Diário do Pará - 03/05/2010

sábado, 1 de maio de 2010

Sobre a tortura

DECISÃO DO STF MANTÉM IMPUNES TORTURADORES DA DITADURA MILITAR NO BRASIL

Leia na íntegra:
Danos Provocados por Vacinas São Escondidos nas Estatísticas.


Leia a matéria na íntegra, no site Mídia Independente:
http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2010/04/470700.shtml

Sobre o conteúdo do Blog...

Todas as matérias deste blog são conseguidas e/ou baseadas em conteúdos de sites da Internet e sempre contêm os créditos ao autor, citação da fonte, entre outros dados que visem à garantia dos direitos autorais, bem como as referências bibliográficas quando se tratarem de textos de minha autoria. Trata-se de um blog de divulgação cultural, sem fins lucrativos.

quarta-feira, 28 de abril de 2010

UFPA adotará o Enem. Parcialmente...


: :UFPA define regras para o processo seletivo 2011

O Conselho Superior de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE) da UFPA decidiu, nesta terça-feira, dia 27, adotar  o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) como uma das etapas do processo seletivo da Instituição, já a partir do próximo vestibular. A seleção ficará a cargo completo da Universidade, que não adotará o Sistema de Seleção Unificado do Ministério da Educação (SiSU), apenas o ENEM, tendo total autonomia para definir as regras internas do certame.

A prova do ENEM é formada por 180 questões, sendo 45 de cada disciplina, contemplando quatro grandes áreas do conhecimento: Linguagens e Códigos, Ciências Humanas, Ciências da Natureza, Matemática e sua Tecnologias, mais uma redação. O Exame Nacional será considerado uma primeira etapa para ingresso na Federal Paraense, apresentando ponto de corte apenas na redação, que deverá exigir pontuação mínima para a aprovação do candidato à próxima fase.

Outra decisão relativa ao processo tomada na tarde desta terça-feira é a de que a prova do ENEM e a prova local como segunda etapa a ser ofertada pela UFPA terão pesos iguais, ou seja, a ponderação para computar o resultado final levará em consideração o desempenho dos candidatos nas duas provas com importância de 50% para cada uma. Somente a prova específica da UFPA deverá estabelecer um número mínimo de acertos de questões.

A prova local será elaborada na mesma matriz do conteúdo programático do Exame Nacional, mas deverá conter questões com abordagem de aspectos regionais, contextualizando a realidade da região amazônica nas habilidades que se esperam ser do conhecimento do candidato. A decisão foi tomada pelos conselheiros com base em ampla discussão sobre a importância de o aluno ingressar no ensino superior com conhecimento global, sem, no entanto, negligenciar as especificidades do contexto regional.

A priori, a etapa a ser elaborada pela UFPA apresentará um total de 55 questões objetivas, sendo 5 referente a cada uma das 11 disciplinas que constam no currículo escolar do ensino médio. Como a etapa do ENEM já trará a prova de redação, a segunda não exigirá do candidato a elaboração de textos. Mas, diferentemente do Exame Nacional, a UFPA manterá a exigências das leituras obrigatórias e da prova de língua estrangeira, podendo o candidato optar por Inglês, Espanhol, Francês, Alemão ou Italiano.

Outras decisões de cunho operacional e detalhes sobre os aspectos discutidos no CONSEPE serão tratados de modo mais aprofundado pela Comissão Permanente de Processos Seletivos (COPERPS), pelo Centro de Processos Seletivos (CEPS), pela Pró-Reitoria de Ensino e de Graduação (PROEG) e por uma comissão especial criada para tal no âmbito da UFPA com representantes de todas as referidas unidades.


Texto: Jéssica Souza – Assessoria de Comunicação da UFPA  
Do fundo do baú, fuçando na grande rede, encontrei uma entrevista com o educador Paulo Freire.


“Se a educação não transformar a sociedade, sem ela a sociedade tampouco muda.”



Paulo Freire
Paulo Freire
Ele partiu em 1997, dois anos antes de o Almanaque ganhar os céus. Porém, desde então, Paulo Freire tem sido presença constante por aqui – seja em perfis biográficos, citações ou notas sobre obras que analisaram sua vida e legado. Seu principal campo de batalha foi tema de inúmeras entrevistas. É quase unanimidade entre as dezenas de personalidades que ocuparam esta seção que os caminhos para a transformação do País passam inevitavelmente pela educação. Nesse mês que marca o início de um novo ano – um ano de mudanças de governantes por todo o País –, empunhamos mais uma vez esta bandeira, agora muito bem acompanhados. Tomamos de empréstimo seus pensamentos em vídeos, palestras, entrevistas e, sobretudo, em seus próprios escritos para provar que, apesar de ter nos deixado há 13 anos, o legado do mais importante educador brasileiro segue vivo. E extremamente necessário.
Como foi a sua infância?
Fui alfabetizado no chão do quintal de minha casa, à sombra das mangueiras, com palavras do meu mundo, não do mundo maior dos meus pais. O chão foi o meu quadro-negro; gravetos, o meu giz. Meu primeiro mundo foi o quintal de casa, com suas mangueiras, cajueiros de fronde quase ajoelhando-se no chão sombreado, jaqueiras e barrigudeiras. Árvores, cheiros, frutas, que, atraindo passarinhos vários, a eles se davam como espaço para seus cantares.(1) Tempos depois, vivendo em Jaboatão dos Guararapes, experimentei o que é a fome e compreendi a fome dos demais. Em Jaboatão, criança ainda, converti-me em homem graças à dor e ao sofrimento que não me submergiram nas sombras da desesperação. Em Jaboatão joguei bola com os meninos do povo. Nadei no rio e tive “minha primeira iluminação”: um dia contemplei uma moça despida. Ela me olhou e se pôs a rir…(2)
O senhor formou-se em Direito. Chegou a exercer a profissão?
Meu gosto não era pela advocacia. Descobri isso logo no começo. Minha primeira causa, recém-formado, foi com um jovem dentista que comprou um equipamento dentário e não pôde pagar. E eu era advogado do credor dele. Chamei o rapaz ao meu escritório: “É, doutor Paulo, eu não posso pagar. E o senhor não vai poder me acionar contra, não pode tomar meus instrumentos de trabalho. Nem tampouco minha filhinha. Mas o meus móveis o senhor pode tomar.” Deixei de ser advogado naquele dia. Eu disse pra ele: “Olhe, vá para casa, passe uns dias em paz com tua mulher, porque daqui a 15 dias eu vou devolver essa causa. Teu credor vai ter mais uma semana para arranjar outro advogado como eu, e aí vai te aperrear de novo.”(3) Ali encerrava a minha carreira como advogado. Ao contar para a minha mulher naquela mesma noite, ela riu, me beijou e disse: “Eu sabia que um dia isso ocorreria. O que você tem que fazer é educação”.(4)
A cultura é um elemento presente em sua visão sobre a educação. Como isso se refletiu na prática pedagógica?
Com as discussões sobre o conceito de cultura, o analfabeto descobriria que tanto é cultura o boneco de barro feito pelos artistas, seus irmãos do povo, como cultura também é a obra de um grande escultor, de um grande pintor, de um grande místico, ou de um pensador. Cultura é a poesia dos poetas letrados de seu país, como também a poesia de seu cancioneiro popular. Cultura é toda criação humana.5 Todos os povos têm cultura, porque trabalham, porque transformam o mundo e, ao transformá-lo, se transformam. A dança do povo é cultura. A música do povo é cultura, como cultura é também a forma como o povo cultiva a terra. Cultura é também a maneira que o povo tem de andar, de sorrir, de falar, de cantar enquanto trabalha. Cultura são os instrumentos que o povo usa para produzir. Cultura é a forma como o povo entende e expressa o seu mundo e como o povo se compreende nas suas relações com o seu mundo. Cultura é o tambor que soa pela noite adentro. Cultura é o ritmo do tambor. Cultura é a ginga dos corpos do povo ao ritmo dos tambores.(1)
Por que o analfabetismo ainda existe?
Para a concepção crítica, o analfabetismo nem é uma “chaga”, nem uma “erva daninha” a ser erradicada, nem tampouco uma enfermidade, mas uma das expressões concretas de uma realidade social injusta. Ninguém é analfabeto por eleição, mas como consequência das condições objetivas em que se encontra. Em certas circunstâncias, o analfabeto é o homem que não necessita ler; em outras, é aquele ou aquela a quem foi negado o direito de ler.(6)
O senhor considera que suas ideias mudaram a alfabetização no País?
Que podem um trabalhador camponês ou um trabalhador urbano retirar de positivo para seu que-fazer no mundo, para compreender criticamente a situação concreta de opressão em que se acham, através de um trabalho de alfabetização em que se lhes diz, adocicadamente, que a “asa é a da ave” ou “Eva viu a uva”? Mais que escrever e ler que “asa é a da ave”, os alfabetizandos necessitam perceber a necessidade de um outro aprendizado: o de “escrever” a sua vida, o de “ler” a sua realidade – o que não será possível se tomam a história nas mãos para, fazendo-a, por ela serem feitos e refeitos.(6)
Por que sua prática educacional provocou discórdias, culminando inclusive em seu exílio?
É que às classes dominantes não importava que eu não tivesse um rótulo porque elas davam um. Para elas eu era comunista, inimigo de Deus e delas. E não importava que eu não fosse. Perfila quem tem poder. Quem não tem poder é perfilado. A classe dominante tinha poder suficiente para dizer que eu era comunista. É claro que havia um mínimo de condições objetivas para que eles pudessem fazer essas acusações. A fundamentação básica para que eu fosse chamado comunista eu dava. Eu pregava uma pedagogia desveladora das injustiças; desocultadora da mentira ideológica. Que dizia que o trabalhador como educando tinha o dever de brigar pelo direito de participar da escolha dos conteúdos ensinados a ele. Eu defendia uma pedagogia democrática que partia das ansiedades, dos desejos, dos sonhos, das carências das classes populares. Essa pedagogia era mais perigosa do que o discurso sectário stalinista. Isso é óbvio. Do ponto de vista dos que deram o golpe de Estado, me pôr na cadeia foi uma atitude ideologicamente correta. Eles diziam que eu era um subversivo internacional. Eu não cheguei a tanto, mas era um cara de sonhos revolucionários.(4)
O que o senhor considera uma educação para a transformação?
Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda.(7) Não devemos chamar o povo à escola para receber instruções, postulados, receitas, ameaças, repreensões e punições. Mas para participar coletivamente da construção de um saber, que vai além do saber de pura experiência feito, que leve em conta as suas necessidades e o torne instrumento de luta, possibilitando-lhe transformar-se em sujeito de sua própria história.(8) A tradição brasileira, profundamente autoritária, coloca sempre o formando como objeto sob a orientação do formador, que funciona como o sujeito que sabe. É preciso deixar de ser assim. Conhecimento não se transfere, conhecimento se constrói.(9)
Paulo Freire
Paulo Freire
Qual a razão de tanta luta ao longo de sua vida?
Eu recuso qualquer previsão fatalista diante da história e dos fatos. Eu não aceito expressões como: “Lamento que haja tantos brasileiros e tantas brasileiras morrendo de fome, mas afinal a realidade é essa mesma”. Eu recuso. É falsa, é ideológica. Nenhuma realidade é assim mesmo. Toda realidade está submetida à possibilidade de nossa intervenção. A história da luta pela justiça rural e agrária neste país revela a superação da posição inicial da adaptação e adequação, inclusive como uma forma de defesa. Uma das razões da minha luta e presença no mundo é que, como educador, eu posso contribuir para uma assunção crítica da possibilidade da passividade, para que se vá além dessa passividade, do que chamo de posturas rebeldes e transformadoras do mundo.(10)
O senhor se considera um sonhador? 
Esperançosamente luto pelo sonho, pela utopia, pela esperança, na perspectiva de uma Pedagogia crítica. E esta não é uma luta vã.(11) Para mim o utópico não é o irrealizável; a utopia não é o idealismo, é a dialetização dos atos de denunciar e anunciar. O ato de denunciar a estrutura desumanizante e de anunciar a estrutura humanizante. Por esta razão a utopia é também um compromisso histórico.(2)
É do ser humano sonhar?
É inviável o ser humano continuar se ele para de pensar no amanhã. Não importa que seja um pensamento em torno do amanhã, o mais ingênuo possível, o mais imediato, o de se a gente terá café amanhã, ou se a gente vai ler ou reler Hegel ou Marx. Não importa. Nós somos seres de tal maneira constituídos, que o presente, o passado e o futuro nos enlaçam. A minha tese então é a seguinte: não pode existir um ser permanentemente preocupado com o vir a ser, portanto com o amanhã, sem sonhar. É inviável. Sonhar aí não significa sonhar a impossibilidade, mas projetar. Significa arquiteturar, significa conjecturar sobre o amanhã.(3)
Trata-se de um ato político?
Eu não posso sonhar em favor de alguma coisa se não sonho contra outra – que é aquela que obstaculiza a realização do meu sonho. Eu não posso sonhar se não tenho clareza com que e a favor de quem eu sonho. Daí o ato de sonhar ser político. Um ato ético, e um ato estético. Não é possível sonhar sem boniteza, e sem moralidade, e sem opção política. Quando você me diz: “Paulo, eu também sonho”, eu quero saber com que e a favor de quem você sonha. Qual é o sujeito beneficiário do teu sonho? É a burguesia que explora ou é a massa deserdada que sofre? E não basta que você me diga: “Eu sonho pela humanidade”. A humanidade é uma abstração. Não existe.
O meu sonho é que inventemos uma sociedade menos feia do que a de hoje. Menos injusta, que tenha mais vergonha. Esse é o meu sonho.(3)
Por que, afinal, ser professor? 
Sou professor a favor da decência contra o despudor, a favor da liberdade contra o autoritarismo, da autoridade contra a licenciosidade, da democracia contra a ditadura de direita ou esquerda. Sou professor a favor da luta constante contra a ordem capitalista vigente que inventou esta aberração: a miséria na fartura.(12)

O senhor foi feliz?

Fui imensamente feliz. Evidentemente que entre essas alegrias eu também tive minhas raivas, minhas decepções, minhas tristezas, mas não há como escapar disso. O que você tem que fazer é não deixar que a razão de ser da raiva e da tristeza perdurem demais. Nós vivemos muito mais momentos de alegria do que de raiva e tristeza. A raiva também é importante para poder vir a alegria. Sem estouros de raiva não construiremos a alegria.(4)

SAIBA MAIS

(1) A Importância do Ato de Ler, de Paulo Freire (Cortez, 2005).
(2) Conscientização: Teoria e prática da libertação, de Paulo Freire (Centauro, 2001).
(3) Entrevista concedida ao Museu da Pessoa em outubro de 1992.
Disponível em www.museudapessoa.org.br
(4) Entrevista concedida a Mario Sérgio Cortella e Paulo de Tarso Venceslau,
publicada na revista Teoria e Debate em janeiro de 1992.
Disponível no site da Fundação Perseu Abramo: www.fpa.org.br
(5) Educação como Prática da Liberdade, de Paulo Freire  (Paz e Terra, 2007).
(6) Ação Cultural para a Liberdade, de Paulo Freire (Paz e Terra, 1981).
(7) Citação presente na Biblioteca Digital Paulo Freire: www.paulofreire.ufpb.br
(8) A Educação na Cidade, de Paulo Freire (Cortez, 1995).
(9) Perfil biográfico publicado na seção Ilustres Brasileiros do Almanaque Brasil,
em maio de 2005. Disponível em www.almanaquebrasil.com.br
(10) Entrevista concedida à TV PUC de São Paulo em abril de 1997.
Disponível na Biblioteca Digital Paulo Freire: www.paulofreire.ufpb.br 
(11) Pedagogia da Indignação, de Paulo Freire (Unesp, 2000).
(12) Pedagogia da Autonomia, de Paulo Freire (Paz e Terra, 2008).
João Rocha Rodrigues e Bruno Hoffmann

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Eventos Acadêmicos - UFPA


PROEG - "I Seminário de Projetos Educacionais e a construção de uma nova cultura acadêmica na Amazônia"


Realização: 28 a 30 de junho de 2010, no Centro de Convenções da UFPA.
Inscrição: 12/4/2010 a 20/6/2010 (para participantes); 12/4/2010 a 30/4/2010 (para Coordenadores de Projetos inseridos nos Programas da Diretoria de Projetos).
Informações:
fone » 3201-7909
e-mail » dprojetos@ufpa.br
site » http://www.proeg.ufpa.br/seminariodeprojetos 


Tema: "O Nacional e o Local na História da Educação"
Realização: 07 a 09/07/10.



Tema: "Os Usos Políticos, Sociais e Acadêmicos dos Conhecimentos, suas Tensões e Contribuições para a Participação e Controle Social".
Realização: 6 e 7/5/10, no Auditório do Instituto de Ciências Jurídicas (UFPA).


segunda-feira, 12 de abril de 2010

Filhos de políticos em escola pública?

Acabo de ler o artigo "Filhos de políticos nas escolas públicas", escrito pelo senador  (PDT/DF) e professor de economia da UNB, Cristovan Buarque. Na seção "polêmica" da revista Superinteressante, ele defende a ideia de que os políticos brasileiros deveriam ser obrigados a matricular seus filhos na escola pública, destacando que, com isso, ela seria mais valorizada, e as verbas não tomariam outro destino, por questões óbvias. Faz uma comparação entre a parcela mais rica e a mais pobre da população, cujos investimentos em educação estão a distâncias abissais. Os ricos, aí incluídos os parlamentares, nem sonham em matricular seus rebentos nas sucateadas e abandonadas escolas públicas, deixando essa "nobre" tarefa para aqueles menos favorecidos. Cristovan cita o projeto de sua autoria que pretende obrigar vereadores, deputados, prefeitos, senadores e até o presidente da República a colocar seus filhos na rede pública, sob pena de perda do mandato. Cita como exemplo o Reino Unido e Cingapura, onde essa prática é comum. Acredita que, se os parlamentares matricularem seus filhos na escola pública, serão obrigados, também a fazê-la funcionar com qualidade total, diminuindo a desigualdade entre ricos e pobres no que se refere à educação. Finalmente alguém acorda para a triste realidade de nossas escolas, aonde político só vai no dia da inauguração. Se aprovada, a lei do senador Buarque vai ao menos diminuir a arrogância e a falta de zelo dos mandatários deste país, que só veem na educação pública uma forma rápida e fácil de desviar recursos para seus bolsos.

Fonte: Revista Superinteresante - Abril/2010, pág. 37 - Seção Polêmica. Editora Abril, 2010

sexta-feira, 12 de março de 2010

Humor

Esposa carinhosa - a depilação masculina
Depois da Depilação na Virilha, agora temos um homem que foi submetido a esta cruel forma de tortura. Este texto foi publicado há mais de um ano no Melhores da Web, do meu amigo Lucas. Confiram:
Estava eu assistindo tv numa tarde de domingo, naquele horário em que não  se pode inventar nada o que fazer, pois no outro dia é segunda-feira,  quando  minha esposa deitou ao meu lado e ficou brincando com minhas”partes”.
Após alguns minutos ela veio com a seguinte idéia:
-Por que não depilamos seus ovinhos, assim eu poderia fazer “outras coisas”com eles! ! ! !
Aquela frase foi igual um sino na minha cabeça. Por alguns segundos fiquei imaginando o que seriam “outras coisas”. Respondi que não, que doeria… coisa e tal, mas ela veio com argumentos sobre as novas técnicas de depilação e eu não tive mais como negar. Concordei.
la me pediu que ficasse pelado enquanto buscaria os equipamentos necessários para tal feito. Fiquei olhando para TV, porém minha mente estava vagando pelas novas sensações que só acordei quando escutei o beep do microondas.
Ela voltou do quarto com um pote de cera, uma espátula e alguns pedaços de plástico. Achei meio estranho aqueles equipamentos, mas ela estava com um ar de “dona da situação” que deixaria qualquer médico urologista sentindo-se como residente. Fiquei tranqüilo e autorizei o restante do processo.
Pediu para que eu ficasse numa posição de quase-frango-assado e liberasse o acesso à zona do agrião. Pegou meus ovinhos como quem pega duas bolinhas de porcelana e começou a passar cera morna. Achei aquela sensação  maravilhosa!!
O Sr. Pinto já estava todo “pimpão” como quem diz: “sou o próximo da fila”!!

Pelo início, fiquei imaginando quais seriam as “outras coisas” que viriam.
Após estarem completamente besuntados de cera, ela embrulhou ambos no plástico com tanto cuidado que eu achei que iria levá-los para viagem.
Fiquei imaginando onde ela teria aprendido essa técnica de prazer: Na Tailândia, na China ou pela Internet mesmo. Porém, alguns segundos depois ela esticou o saquinho para um lado e deu um puxão repentino. Todas as novas sensações foram trocadas por um sonoro P…QUEOPARIU quase falado letra por letra.
Olhei para o plástico para ver se o couro do meu saco não tinha ficado grudado na cera. Ela disse que ainda restaram alguns pelinhos e que precisava passar de novo. Respondi prontamente: Se depender de mim eles vão ficar aí para a eternidade!!
Segurei o Dr. Esquerdo e o Dr. Direito em minhas respectivas mãos, como quem segura os últimos ovos da mais bela ave amazônica em extinção, e fui para o banheiro. Sentia o coração bater nos ovos. Abri o chuveiro e foi a primeira vez que eu molho o saco antes de molhar a cabeça. Passei alguns minutos só deixando a água escorrer pelo meu corpo.
Saí do banho, mas nesses momentos de dor qualquer homem vira um bebezinho novo: faz merda atrás de merda. Peguei meu gel pós barba com camomila “que acalma a pele”, enchi as mãos e passei nos ovos. Foi como se tivesse passado molho de pimenta. Sentei na privada, peguei a toalha de rosto e fiquei abanando os ovos como quem abana um boxeador no 10° round. Olhei para meu pinto. Ele era tão alegrinho minutos atrás, estava tão pequeno que mais parecia que eu tinha saído de uma piscina à 5 graus abaixo de zero.
Nesse momento minha esposa bate na porta do banheiro e perguntou o que estava acontecendo. Aquela voz antes aveludada ficou igual um carrasco mandando eu entregar o presidente da revolução.
Saí do banheiro e voltei para o quarto. Ela estava argumentado que os pelos tinham saído pelas raízes, que demorariam para voltar a nascer. “Pela espessura da pele do meu saco, meus netos irão nascer sem pelos nos ovos”, respondi.
Ela pediu para olhar como estavam. Eu falei para olhar com meio metro de distância e sem tocar em nada!!
Vesti a camiseta e fui dormir (somente de camiseta). Naquele momento sexo para mim seria somente para perpetuar a espécie humana.
No outro dia pela manhã fui me arrumar para ir trabalhar. Os ovos estavam  mais calmos, porém mais vermelhos que tomates maduros. Foi estranho sentir o vento bater em lugares nunca antes visitados. Tentei colocar a cueca, mas nada feito. Procurei alguma cueca de veludo e nada. Vesti a calça mais  folgada que achei no armário e fui trabalhar sem cueca mesmo.
Entrei na minha seção andando igual um cowboy cagado. Falei bom dia para todos, mas sem olhar nos olhos. E passei o dia inteiro trabalhando em pé com  receio de encostar os tomates maduros em qualquer superfície.
Resultado:
Certas coisas devem ser feitas somente pelas mulheres. Não adianta tentar misturar os universos masculino e feminino.


quinta-feira, 11 de março de 2010

Enquanto houver sol

Enquanto houver sol
Sérgio Britto

Quando não houver saída
Quando não houver mais solução
Ainda há de haver saída
Nenhuma ideia vale uma vida
Quando não houver esperança
Quando não restar nem ilusão
Ainda há de haver esperança
Em cada um de nós, algo de uma criança

Enquanto houver sol, enquanto houver sol
Ainda haverá
Enquanto houver sol, enquanto houver sol

Quando não houver caminho
Mesmo sem amor, sem direção
A sós ninguém está sozinho
É caminhando que se faz o caminho
Quando não houver desejo
Quando não restar nem mesmo dor
Ainda há de haver desejo
Em cada um de nós, aonde Deus colocou

Enquanto houver sol, enquanto houver sol
Ainda haverá
Enquanto houver sol, enquanto houver sol

quarta-feira, 10 de março de 2010

Pierre de Bourdieu


Foto:
Foto: As pesquisas de Bourdieu exerceram forte influência na Educação durante os anos 70 e 80

As pesquisas de Bourdieu exerceram forte influência na Educação durante os anos 70 e 80

Frases de Pierre Bourdieu:
“Não há democracia efetiva sem um verdadeiro poder crítico”

“Nada é mais adequado que o exame para inspirar o reconhecimento dos veredictos escolares e das hierarquias sociais que eles legitimam”


Pierre Bourdieu nasceu em 1930 no vilarejo de Denguin, no sudoeste da França. Fez os estudos básicos numinternato em Pau, experiência que deixou nele profundas marcas negativas. Em 1951 ingressou na Faculdade de Letras, em Paris, e na Escola Normal Superior. Três anos depois, graduou-se em filosofia. Prestou serviço militar na Argélia (então colônia francesa), onde retomou a carreira acadêmica e escreveu o primeiro livro, sobre a sociedade cabila. De volta à França, assumiu a função de assistente do filósofo Raymond Aron (1905-1983) na Faculdade de Letras de Paris e, simultaneamente, filiou-se ao Centro Europeu de Sociologia, do qual veio a ser secretário-geral. Bourdieu publicou mais de 300 títulos, entre livros e artigos. Fundou as publicações Actes de la Recherche en Sciences Sociales e Liber. Em 1982, propôs a criação de uma “sociologia da sociologia” em sua aula inaugural no Collège de France, levando esse objetivo em frente nos anos seguintes. Quando morreu de câncer, em 2002, foi tema de longos perfis na imprensa européia. Um ano antes, um documentário sobre ele, Sociologia É um Esporte de Combate, havia sido um sucesso inesperado nos cinemas da França. Entre seus livros mais conhecidos estão A Distinção (1979), que trata dos julgamentos estéticos como distinção de classe, Sobre a Televisão (1996) eContrafogos (1998), a respeito do discurso do chamado neoliberalismo.

Embora a maioria dos grandes pensadores da educação tenha desenvolvido suas teorias com base numa visão crítica da escola, somente na segunda metade do século 20 surgiram questionamentos bem fundamentados sobre a neutralidade da instituição. Até ali a instrução era vista como um meio de elevação cultural mais ou menos à parte das tensões sociais. O francês Pierre Bourdieu empreendeu uma investigação sociológica do conhecimento que detectou um jogo de dominação e reprodução de valores.

Suas pesquisas exerceram forte influência nos ambientes pedagógicos nas décadas de 1970 e 1980. “Desde então, as teorias de reprodução foram criticadas por exagerar a visão pessimista sobre a escola”, diz Cláudio Martins Nogueira, professor da Universidade Federal de Minas Gerais. “Vários autores passaram a mostrar que nem sempre as desigualdades sociais se reproduzem completamente na sala de aula.” Na essência, contudo, as conclusões de Bourdieu não foram contestadas.

Na mesma época em que as restrições a sua obra acadêmica se tornaram mais freqüentes, a figura pública do sociólogo ganhou notoriedade pelas críticas à mídia, aos governos de esquerda da Europa e à globalização. Ele costuma ser incluído na tradição francesa do intelectual público e combativo, a exemplo do escritor Émile Zola (1840-1902) e do filósofo Jean Paul Sartre (1905-1980).

Valores incorporados

O livro A Reprodução (1970), escrito em parceria com Jean-Claude Passeron, analisou o funcionamento do sistema escolar francês e concluiu que, em vez de ter uma função transformadora, ele reproduz e reforça as desigualdades sociais. Quando a criança começa sua aprendizagem formal, segundo os autores, é recebida num ambiente marcado pelo caráter de classe, desde a organização pedagógica até o modo como prepara o futuro dos alunos.

Para construir sua teoria, Bourdieu criou uma série de conceitos, como habitus e capital cultural. Todos partem de uma tentativa de superação da dicotomia entre subjetivismo e objetivismo. “Ele acreditava que qualquer uma dessas tendências, tomada isoladamente, conduz a uma interpretação restrita ou mesmo equivocada da realidade social”, explica Nogueira. A noção de habitus procura evitar esse risco. Ela se refere à incorporação de uma determinada estrutura social pelos indivíduos, influindo em seu modo de sentir, pensar e agir, de tal forma que se inclinam a confirmá-la e reproduzi-la, mesmo que nem sempre de modo consciente.

Um exemplo disso: a dominação masculina, segundo o sociólogo, se mantém não só pela preservação de mecanismos sociais mas pela absorção involuntária, por parte das mulheres, de um discurso conciliador. Na formação do habitus, a produção simbólica – resultado das elaborações em áreas como arte, ciência, religião e moral – constitui o vetor principal, porque recria as desigualdades de modo indireto, escamoteando hierarquias e constrangimentos.

Assim, estruturas sociais e agentes individuais se alimentam continuamente numa engrenagem de caráter conservador. É o caso da maneira como cada um lida com a linguagem. Tudo que a envolve
– correção gramatical, sotaque, habilidade no uso de palavras e construções etc. – está fortemente relacionado à posição social de quem fala e à função de ratificar a ordem estabelecida. Para Bourdieu, todas essas ferramentas de poder são essencialmente arbitrárias, mas isso não costuma ser percebido. “É necessário que os dominados as percebam como legítimas, justas e dignas de serem utilizadas”, afirma Nogueira.

Capital cultural

Outro conceito utilizado por Bourdieu é o de campo, para designar nichos da atividade humana nos quais se desenrolam lutas pela detenção do poder simbólico, que produz e confirma significados. Esses conflitos consagram valores que se tornam aceitáveis pelo senso comum. No campo da arte, a luta simbólica decide o que é erudito ou popular, de bom ou de mau gosto. Dos elementos vitoriosos, formam-se o habitus e o código de aceitação social.

Os indivíduos, por sua vez, se posicionam nos campos de acordo com o capital acumulado – que pode ser social, cultural, econômico e simbólico. O capital social, por exemplo, corresponde à rede de relações interpessoais que cada um constrói, com os benefícios ou malefícios que ela pode gerar na competição entre os grupos humanos. Já na educação se acumula sobretudo capital cultural, na forma de conhecimentos apreendidos, livros, diplomas etc.

Com os instrumentos teóricos que criou, Bourdieu afastou de suas análises a ênfase central nos fatores econômicos – que caracteriza o marxismo – e introduziu, para se referir ao controle de um estrato social sobre outro, o conceito de violência simbólica, legitimadora da dominação e posta em prática por meio de estilos de vida. Isso explicaria por que é tão difícil alterar certos padrões sociais: o poder exercido em campos como a linguagem é mais eficiente e sutil do que o uso da força propriamente dita.

Os sutis artifícios da perpetuação

Para Bourdieu, a escola é um espaço de reprodução de estruturas sociais e de transferência de capitais de uma geração para outra. É nela que o legado econômico da família transforma-se em capital cultural. E este, segundo o sociólogo, está diretamente relacionado ao desempenho dos alunos na sala de aula. Eles tendem a ser julgados pela quantidade e pela qualidade do conhecimento que já trazem de casa, além de várias “heranças”, como a postura corporal e a habilidade de falar em público. Os próprios estudantes mais pobres acabam encarando a trajetória dos bem-sucedidos como resultante de um esforço recompensado. Uma mostra dos mecanismos de perpetuação da desigualdade está no fato, facilmente verificável, de que a frustração com o fracasso escolar leva muitos alunos e suas famílias a investir menos esforços no aprendizado formal, desenhando um círculo que se auto-alimenta. Nos primeiros livros que escreveu, Bourdieu previa a possibilidade de superar essa situação se as escolas deixassem de supor a bagagem cultural que os alunos trazem de casa e partissem do zero. Mas, com o passar do tempo, o pessimismo foi crescendo na obra do sociólogo: a competição escolar passou a ser vista como incontornável.

Para pensar

Freqüentemente fazemos, sem perceber, julgamentos severos com base em motivos nada consistentes ou, pior, preconceituosos. Na escola, é comum alunos serem discriminados por causa de sua aparência e seus hábitos. Você já observou como muitas vezes isso é uma manifestação de sentimentos de superioridade de alguns grupos sociais em relação a outros?